sábado, 25 de agosto de 2012

Invento-me

Seremos tu e eu, sempre só dois ou sempre só um,
só três vagabundos perdidos num vazio incomum.
Abandonaremos fantasmas apadrinhados,
tal como os leões bravos e assanhados.

Nesta casa, neste incolor habitat
mergulham leves bichos num ar denso.
O nosso romance tem de tudo o que bonito há,
menos pouco muito pequeno pedaço suspenso.

E quando as lágrimas correm para o mar,
evaporam-se, bem antes de conseguirem lá chegar.
Já que o nosso amor abrasador ergue-se somente,
como uma formosa flor, apartir de uma ordinária semente.

Invento então a perfeita conjunção,
a mais que extraordinária fusão
do que diz respeito à nossa paixão.

Aos teus olhos,
invento-me.

«jd»

domingo, 19 de agosto de 2012

Dádiva Doada

            A pesquisa dá inicio à procura. Procuramos sonhos quebrados, terras escondidas, casas inflamadas e causas perdidas. Procuramos monstros encantados, fadas mutiladas. Remexemos baús com memórias açucaradas, com variadas infâncias mascaradas. O homem engravatado surge aos olhos da criança. A mulher de buço novo abraça-te com confiança. A varicela não te mata, apenas reveste. O vento não te adoece, é só um protótipo de peste. Brinca com as palavras. Junta os cubos. Forma simpatias, sublimes sinfonias! Sê mais de ti. Não és um software estragado. Excede-te, vicia-te. Procura o amargo, evita o doce. Odeias o espargo, energia precoce.
           Planeamos um futuro equacionado na razão dum passado injuriado. Somos obrigados a presentear o presente com a força de querer viver sempre um pouquinho mais. Pouco mais devemos vogar senão pela congratulação da dádiva que é viver.
           Viver é o dom.

«jd»

sábado, 18 de agosto de 2012

Pesquisa

Há um trapézio, uma balança, um equilíbrio, uma droga enfim, qualquer coisa aonde te descontrolas. Há uma passada de valsa que desenhas mal consecutivamente. Há toda uma logística inanimada no chão que pisas. Há pedaços de ar partido, dispersados pelo chão em teu redor. Olha-os. Sê vigilante. Há peças de quadro à posteriori mal pintado. Repensa isso. Há cicatrizes de oxigénio que desperdiças, sempre haverá. Tempo largado que enfraqueces. Papoilas soltas ao mar, como aviões incontrolados flutuando num referto divagar. Há também insetos que irrompem pelo chuveiro onde te banhas. Há de tudo meu amigo. E nada disso pede egoísmo. Pede copos partidos, tanto o queiras. Pede manchas que se apregoem ao povo. Pede sinais feios, sílabas certas, corações amargos e finais felizes. Palavras baratas, todavia acertadas. Não me pede a mim. Não pede este homem; um homem, nem tão pouco pede dois. O que achas? Não pede nem um batalhão deles. Pede confusão! Caos, instaurado numa trincheira que dispõe aliados que se atormentam: o homem, mais a paixão que o rebenta do peito para o exterior. E o salgado das lágrimas? Não existe. É ficção. É uma espécie de micro-novela inventada por cérebros um pouquinho disfuncionais. Há sempre um livro que nunca abrimos. Abrimos outros então, não é? Há sempre paixões como livros. Há sempre livros como paixões. Paixões que contam livros. A paixão não precisa de banda sonora. A banda sonora não tem de suportar paixões. E as paixões não suportam flexões mal comportadas. Não faço parágrafos porque não há coisas concretas a dizer quando escrevo. A prosa aparece sistematicamente ofegante, quiçá, talvez viesse de uma corrida. Ou, se me permites refletir melhor, acho que a prosa esteve a chorar. A pesquisa começou.

«jd»

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Contra-senso

Não precisas gostar de mim
e de todos os meus laços.
Não necessitas querer-me suportar
e seguir todos os meus passos.

Tens de me deixar arruinado
a um canto mal arrumado,
por ausentes duros momentos a solo
cedendo-me a um ventre sem colo.

Senão imagina, fico doente.
Doente de mim, não enfermo de ti.
Doente pelo que recentemente
me descobri. De ti.

De ti, de tu. És tu. És tudo.
És tudo, e tudo mais para mim.
Ambiciono mais para ti que só me teres.
Não te contenhas. Não me tenhas.
Eu trato de mim,
sei que só viverei
até ao nosso fim.

Sou contra-senso pleno
e demais intenso.
Sou a aura que flutua
sob o que já não penso.
Sou ambiguidade, nostalgia.
Incessante hemorragia.

Sou músculo vermelho quebrado,
sou mágico recém-chegado.
Mas deixa-me, que te quero mais melhor!
Quero-te tanta sorte mais, maior!

Venero-te principessa,
como se fosses a mais
funcional engenha peça.

És, tanto como sempre serás, a vital peça da ignição.
A que liga o meu complicado circuito ao teu descuidado coração.

«jd»

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Agonia

É uma imácula saudade na ausência de competição,
que eu sinto e que, de futuro, tão amargamente, não pressinto.
Absorto em si mesmo, o meu beijo introvertido não deixa de ser tímido.
Desconectado nos demais, o teu lábio faz-me esquecer a dor e o gemido.

É uma dor possante que me invade cem, e sem intervalo.
Corre, salta; voa com a suprema elegância de um cavalo.
Abrupta-me como um suspiro crivado e mal exalado.
Enforca-me como um estilhaço de alçapão mal trancado.

O meu?
O globo deslumbra mil, a corda não depõe duzentos.
A caixa recetora desencaixa trezentos péssimos códigos matriz.
Também não identifica nulos bandidos com duros punhos cimentos,
nem tão pouco degusta ventos como se tratasse de um humano feliz.

Sangue velho corre por canos abusados.
Milícias recrutadas, bando de desgraçados.
Bando dos expirados de graça. Desgraçado eu,
que ainda aguardo o nosso alto apogeu.

Nada em vão, magoa e mata, o desenho animado.
Perigoso o fogo que nos une de tão culpado!

O ciúme intermédio neste espaço repleto de assédio,
deixa sempre rasto de motor com potêncial ruído médio.
Mas atenção! A sua concisa e justa passagem
no fim evapora-se tal a leveza de uma miragem.

«jd»