sábado, 10 de agosto de 2013

Capitalista

Mulher má, dedico-te isto.
           Nem foste uma mulher muito má para mim, foste só uma mulher que passou e fez a sua nhé malvadez. De vez em quando ainda passas por mim e nem dizes nhé olá, mas isso nem é uma nhé matreirice: é uma nhá bênção.
           Bênção é o estado em que me deixaste, porque me preparaste para o que de pior e de melhor o mundo tem para oferecer. Preparaste-me como um mentor prepara o seu discípulo, preparaste-me para a guerra sem avisares que o que se avistava no horizonte não era nhé guerra alguma.
           Este período de nhé paz não durará para sempre, mas hás-de-te orgulhar de mim quando vires que fi-lo durar tempo suficiente para te matar de mim. Morreste-me.
           As pessoas dão a importância às coisas com base em estimativas irreais. Dou-te um exemplo rútilo: se fosses uma ação e eu precisasse de te valorizar na Bolsa de Valores, decerto que ficaria com prejuízos tão grandes que desmantelaria todo um Wall Street. Não vales aquilo que eu pedia por ti, foste apenas uma má simulação, uma especulação ácida e corrosiva. Foste-me uma Quinta-Feira negra, uma sobreprodução de paixão que tenciono esquecer. Em apenas dois dias, perdi bem mais que dois mil milhões de dólares em lágrimas. Nunca te vou perdoar por isso.
           Os teus beijos sabiam a notas, sabiam a dinheiro. Se te beijasse de novo, já só saberiam a moedas, a dinheiro. Nada mudaria. Nada mudou. Nada muda. Nada mudará. Nem que os mercados abram amanhã com ganhos desmedidos, nem que as ações voltem a valorizar, nem que a América conquiste o espaço. Nada mudará.
           Mulher má, dedico-te isto.
           Hoje controlo a Bolsa, toda a indústria e todas as matérias-primas. Não existe acioniosta mais poderoso que eu. A prosperidade vai voltar e eu vou voltar com ela. Acabou-se a Era da Grande Depressão. Acabou-se o desemprego, acabou-se a fome e acabou-se os vícios à margem da lei. Eu serei o Estado que rege as normas mais pequenas. E mesmo essas normas mais pequenas, que regem valores ainda mais invisíveis e somente morais e não-escritos, terão respeito por mim.
          Até tu, que nunca tiveste valores - e que, se os tiveste, nunca mos mostraste - terás respeito pela minha obra. A minha obra será marcada por esta aventura que edifico contra ti. Esta atrocidade que não tem razão lúcida para existir, levantar-se-á sempre que pensares em mim. Se eu deixar de ser o poeta que sou, será apenas em tua memória, porque morreste de corpo. Mas, enquanto viveres, nunca deixarei de ser dotado para o verso. Terei sempre uma razão para escrever, uma razão que me estará reclusa e casada na memória.
         Mulher má, por ti e só por ti, nunca baixarei a guarda por mulher nenhuma. Muniste-me de sobriedade contra a malvadez infantil e dócil que todas as mulheres possuem. Por tua causa, nunca serei um totó.
        Obrigado mulher má. E nhá adeus.
«jd»

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